quarta-feira, 12 de maio de 2010

Excesso de amor OU falta de cobrança? (Uma visão sobre o ensino no Brasil)

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Estou refletindo sobre os casos de alguns alunos meus (boa parte se enquadra nessa categoria) e percebo que os pais vem confundindo AMOR com NÃO EXIGIR RESPONSABILIDADE dos filhos.

Um dia desses uma mãe veio conversar comigo sobre seu filho e me falou de seu empenho para que ele só começasse a trabalhar depois de terminar (ao menos) o ensino médio. O que de modo geral é um desejo e um empenho digno de respeito. No entanto, o que me faz parar para pensar é o fato de ele estar com 16 anos na 6ª série do fundamental. Ou seja, pelo menos 4 anos atrasado e com um mau desempenho neste ano letivo. Se ele continuar assim terminará o ensino médio beirando os 30, ou mais... Será que uma mãe de baixa renda (por maior que seja sua boa vontade) pode sustentar um filho (para que este se dedique unicamente aos estudos) até a idade de 30 anos?!

E aí entra outro ponto. Sustentar “para que este se dedique unicamente aos estudos”. Mas, pelo que se observa, não é o que está sendo feito por parte deste adolescente. E é o que, infelizmente se pode generalizar do comportamento da maioria dos adolescentes (alunos de 5ª a 8ª e do ensino médio). E me pergunto, então:

# Será louvável que esta mãe se dedique tanto para que ele termine seus estudos, sem antes precisar começar a trabalhar?!

# Será que ela não está contribuindo para que ele protele a tomada da responsabilidade por seus atos ou para que nunca seja responsável por eles?


# Será que não falta, para está mãe, cobrar mais para que seu filho cumpra sua parte no contrato “Te sustentar PARA QUE estudes”?

# E se o filho não cumpre sua parte no contrato, por que a mãe deve se resignar em continuar cumprindo a sua?!

Há desse modo uma corrupção do contrato, que se torna “Te sustentar PARA QUE NÃO estudes”. E, por conseqüência, esta mãe entra em um ciclo vicioso, pois provavelmente será fadada a SUSTENTAR financeiramente este filho que não cumpre sua parte, seu papel, sua única obrigação, que é a de estudar. Logo, será que um dia ele estará preparado para cumprir suas obrigações, na medida em que não está sendo treinado para isso agora?

Nós sabemos que existem muitos motivos que explicam porque os adolescentes perdem o interesse pelos estudos. Há razões de ordem hormonal, sexual, psico-afetiva, ideológica, e assim por diante. Eles são bombardeados por mídias muito mais interessantes e apelativas que as que a escola proporciona ou pode proporcionar. Mas eu me indago:

#Tenho que aceitar estas questões como JUSTIFICATIVAS (ou desculpas) para que eles (os alunos) não estudem? Para que eles não cumpram sua parte no processo de ensino-aprendizagem?

# Pode haver ensino-apredizagem onde só o professor ENSINA e os alunos NÃO ESTUDAM?!

Eu até gostaria de saber se há algum modo deles aprenderem sem assistir aula (gazetando); sem prestar atenção na explicação; sem ler os livros ou apostilas; sem copiar a matéria do quadro (ou de qualquer outra mídia); sem fazer as atividades propostas; fazendo Ctrl+C – Ctrl+V nos trabalhos de pesquisa (sem sequer ler o que estão pesquisando!); sem deixar o professor dar uma boa explicação (ou uma explicação mínima, ao menos) sobre um assunto (bagunçando, gritando, brigando, xingando EM SALA DE AULA NA FRENTE DO PROFESSOR). Isso é possível?!

Eu fico pensando e acho que há uma falta de cobrança geral para com a responsabilidade dos estudantes. Nós professores somos obrigados a “entender” (ou seja, APROVAR) todos os “problemas” dos alunos, e permitir que eles usem isso como desculpa para NÃO ESTUDAR, logo, NÃO APRENDER. Pois não há aprendizagem sem esforço por parte daquele que estuda (ou deveria estudar). Não importa se este tenha acesso a tudo que há de melhor em termos de educação. A diferença se dá nos resultados. Naquilo que acontece da vida desses “DESESTUDANTES”, pois, se suas famílias tem condições financeiras melhores, podem ajudá-los a superar e alcançar uma independência, mesmo que tardia. Mas e no caso das famílias mais pobres?! Não creio que estes possam dar este suporte (por mais que não lhes falte boa vontade, nos casos onde ela existe).

Eu penso que hoje em dia falta cobrança. COBRAR QUE OS ESTUDANTES sejam estudantes de verdade e ESTUDEM! Todas as gerações antes dessa tiveram seus problemas. Todos passamos por problemas hormonais, sexuais, psico-afetivos, fomos bombardeados por informações de mídias muito mais atraentes que as da sala de aula. Mas fomos EXIGIDOS, COBRADOS, RESPONSABILIZADOS pelas conseqüências, caso não cumpríssemos nossa função de estudar.

#Será que essa cobrança é algo perverso que deve ser banido?


#Será que exigir o respeito às regras não faz parte do aprendizado do ser humano para ser um ser social?!

#Será que devemos esperar que os alunos aprendam a cumprir seus deveres de cidadão de forma natural, sem precisar ensiná-los isso?


#Existe aprendizado formal sem cobrança?


#Será que devemos aprovar nossos alunos, mesmo que estes estejam na 8a série sem saber ler, sem saber respeitar hierarquias (O que há de errado em haver hierarquias?), sem habilidade social de comportar-se adequadamente aos contextos? Ou será que somente o contexto escolar será desrespeitado por estes alunos?!


# Devemos aprovar os alunos para que os números mostrem que o analfabetismo está sendo erradicado do Brasil?! ... Mesmo com toda falta de cobrança, nosso IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) é o pior do Brasil... e o do IDEB do Brasil é um dos piores do mundo... Aparentemente a "forçação de barra" institucionalizada para que os alunos sejam promovidos de série, mesmo sem aprender, não está surtindo o efeito desejado...

# O que APROVAÇÃO tem a ver com aprendizado e com QUALIDADE de ensino?!

# Por que não cobrar CONHECIMENTO como MEDIDA DA QUALIDADE de ensino?!


# Por que permitir que os alunos se conformem com a mediocridade de uma média 5 conseguida sem duras penas, ou sem pena nenhuma? Pois os alunos ganham pontos para tudo, inclusive para não violentarem seus professores (fora ou dentro da escola).

# Devemos, nós professores, dar pontos para que nossos alunos não nos roubem, não nos agridam, não nos matem (ou falem para que outros o façam)?! Infelizmente isso é uma realidade hoje em dia...

Acho que muitos estudos já foram feitos no sentido de buscar a responsabilidade dos educadores nas falhas do processo de ensino-aprendizagem. E são estudos extremamente louváveis e ricos. Mas penso que é necessário se pensar também no viés da RESPONSABILIDADE DOS ALUNOS pelo seu processo de APRENDIZAGEM. Claro que creio em nossa responsabilidade em fiscalizar os alunos para que façam sua parte.

# Em que ponto PAIS, ESCOLA E ESTADO estamos sendo negligentes em NÃO COBRAR de nossos alunos para que cumpram suas OBRIGAÇÕES?!
# O que há de errado em COBRAR RESPONSABILIDADE dos alunos?!


# Será que a falta de respeito dos ALUNOS com a ESCOLA (docentes, funcionários e discentes) não é decorrência desse abrandamento da cobrança do CUMPRIMENTO DE SUAS RESPONSABILIDADES? Afinal ELES NÃO SÃO RESPONSABILIZADOS POR SEUS ATOS. A culpa é sempre de terceiros (Família - escola - Estado).

Eu converso com meus alunos e sempre tento fazê-los perceber a importância da RESPONSABILIDADE PESSOAL. Tento orientá-los no sentido de primeiramente procurarem seus erros e depois os alheios, com relação ao que pode dar errado em suas vidas. É quase um exercício religioso... É frustrante... Seria mais fácil apelar para religião, pois está não requer reflexão, somente a aceitação. Eu acho que esses ADOLESCENTES DA ATUALIDADE SÃO EXTREMAMENTE INCONSEQÜENTES. Digo isso no sentido de que eles (de modo geral) NÃO DEMONSTRAM, nenhum pouco, PENSAR SOBRE AS CONSEQÜÊNCIAS DE SEUS ATOS. E isso não somente no que tange os estudos, mas em todos os sentidos. Isso é muito triste e preocupante, pois me faz temer um futuro de barbárie.

Ouvimos tantas notícias e conhecemos tantos casos de adolescentes matando seus colegas dentro de escolas (por vezes dentro da sala de aula); agredindo verbal e fisicamente alunos e professores; transando dentro das escolas (gravando e pondo no Youtube), Além da questão da criminalidade e das drogas que são problemas sociais gravíssimos e que também atingem as escolas (inclusive as onde eu trabalho). Eu fico pensando: Será que esta falta de cobrança para com a responsabilidade dos alunos não é uma das causas dessa violência escolar (e social) desenfreada?!

Fico lembrando da aura de medo e respeito que havia nas escolas na época da minha geração em das anteriores. Nós tínhamos toda uma preocupação no modo como falar e de nos portar na frente dos professores, diretores, coordenadores, secretários, inspetores, bombomzeiras, merendeiras. E caso nos descuidássemos dessa preocupação éramos devidamente repreendidos. Lembro que minha mãe me conta de uma vez que foi suspensa porque estava sentada na mesa (enquanto o professor não estava em sala) e me cogito se certas punições não devem ser usadas com mais freqüência. Tenho refletido sobre a importância do MEDO NA EDUCAÇÃO. O MEDO E O RESPEITO ANDAM JUNTOS. Ninguém respeita o que não teme. Antes os professores eram temidos; a reprovação era temida (Hoje os alunos repetentes são tratados como pop stars...) . O ambiente escolar era ordenado com base no respeito imposto pelo temor. Isso foi muito criticado, mas agora, vendo nossas escolas e nossa sociedade como estão, me pergunto: será que este temor (em uma medida justa) não deve ser restaurado?!

Hoje em dia os alunos brigam dentro de sala (na frente do professor, que muitas vezes tem que apartar a briga) e recebem apenas uma advertência ou são mandados para fora de sala (o que muitos já fazem sem precisar de solicitação do professor) para ficarem gazetando e atrapalhando os alunos e mangando dos professores que estão trabalhando. No meu tempo as pessoas que gazetavam se escondiam para que não fossem pegas pelo inspetor ou ficavam longe da sala batendo papo-furado. Hoje eles ficam na porta da sala para atrapalhar os alunos que estão dentro. E nós professores temos que tomar cuidado para que eles não gravem algo que façamos em sala e tentem nos prejudicar postando vídeos no Youtube ou mesmo processando-nos com algum pretexto esfarrapado... Será que nós professores podemos gravar nossas aulas, a fim de processar os alunos por desrespeito, por sermos violentados todos os dias psicologicamente e por vezes fisicamente também?!

Há muita coisa a ser dita e ver essas coisas todos os dias e não conseguir modificá-las, mesmo com muito esforço para tal, é muito desgastante e desestimulante para um professor e pessoa. Eu fico me perguntando se eu já fui assim INCONSEQUENTE... Mas eu sempre fui “esquisita” desde nova... Sempre pensei muito em tudo, principalmente nas conseqüências dos meus atos. Mas eu sigo pensando, não é necessário que todos sejam altamente responsáveis por natureza, mas É NECESSÁRIO QUE HAJA A COBRANÇA, pois, ao que se vê, se não houver, o caos saíra das escolas e se generalizará. Mas se ainda não se generalizou completamente, o certo é que ele está se espalhando como um câncer... não lento e nem indolor...

4 comentários:

  1. Oa mro por vezes tapa os olhos aos pais... e tapa os olhos também aos professores. Muitas vezes deixo passar certas atitudes e comentários apenas porque sei que eles não se conseguem controlar e não sabem que aquilo é uma falta de respeito para comigo... Provavelmente, aliás, certamente deveria ser mais exigente, mas às vezes falta-me vontade de me zangar com eles... falta-me vontade de me chatear por saber que sou a única que se chateia...

    O amor por si só não é mau, o amor em excesso é uma doença. Temos que tirar o véu de diante dos olhos e tentar dar uma educação firme e coesa aos nossos jovens!...

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  2. Olá!
    Obrigada por visitar meu blog!
    Concordo com vc! O amor muitas vezes cega e pensando em fazer o bem acabamos prejudicando eles...
    Sinto o mesmo que vc. As vezes tbm penso que é melhor não me chatear, pois vou ficar sozinha nessa empreitada...
    Estava conversando com outros professores de uma das escolas onde trabalho e estava falando q temos que ser mais rígidos com nossos aluninhos, pois eles estão em uma fase onde eles tem muitas opções de escolha e pouco poder de reflexão sobre elas. Então, ao menos na escola temos que impor regras rígidas e coerente... isso com certeza foi, é e será sempre útil na formação de td ser humano...
    Grata pelo comentário!
    Um abraço!

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  3. Vou imprimir e ler em todas as minhas turmas. Adorei o texto e me fez pensar que até mesmo EU não estou me cobrando o bastante e cobrando dos meus alunos que sejam pessoas melhores no futuro e no presente.

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  4. Isso é um longo e lento "processo terapeutico", dear Zé!
    Mas se fizer algo já ajuda, mesmo que não mude todo mundo, mas sempre alguns (mesmo que poucos) são tocados...

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